domingo, 31 de agosto de 2008

Convocação para Reunião Ordinária

Foto: Rogelio Casado - Rio Capibaribe - Recife-PE, 2008
Núcleo da Luta Antimanicomial Libertando Subjetividades - PE
(filiado à Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial - RENILA)

Recife, 29 de agosto de 2008

Olá companheiros(as) da Luta Antimanicomial! Convidamos para participar da Reunião Ordinária do Núcleo da Luta Antimanicomial Libertando Subjetividades – PE, no dia 01/09/2008, às 18:00hs, no Auditório do Conselho Regional de Psicologia, localizado a rua Afonso Pena, nº 475, Santo Amaro.

Teremos como pontos de pauta:

· Leitura da ata anterior;
· Discussão e organização da Secretaria Nacional da RENILA assumida pelo Núcleo de Pernambuco;
. Leitura da Ata da Reunião RENILA em Recife;
. Apresentação de Propostas de Ação;
· OFÍCIO-CIRCULAR Nº 116/SE/CNS/GM/MS, de 22 de agosto de 2008, que convoca para a reunião da Comissão Intersetorial de Saúde Mental – CISM/CNS.
· Cobrança da resposta do Governador Eduardo Campos;
. Apresentação do ofício nº 90/2008;
· Eleições nos municípios;
. Apresentação da Carta ao candidatos a prefeito.
· Retrocesso da proposta da GASAM - Emergência do Hospital Geral Otávio de Freitas ser transferida para o HUP;
· PPA Estadual – Discussão no Conselho Estadual de Saúde;
· Violação de direitos humanos e desospitalização do Hospital Alberto Maia;
· IV Conferência Nacional de Saúde Mental JÁ!!!!! Apresentação da Proposta de Panfleto – Heloisa.

Contamos com a presença de tod@s @s companheir@s que lutam no seu dia a dia por uma sociedade mais justa e sem MANICÔMIOS.

Nelma Melo
Coordenadora do Núcleo da Luta Antimanicomial Libertando Subjetividades – PE
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sábado, 23 de agosto de 2008

Carta ao Governador do Estado de Pernambuco

Foto: Rogelio Casado - Rio Capibaribe - Recife-PE - Julho/2008
Recife, 16 de maio de 2008.

Ao Exmo Sr. Governador do Estado de Pernambuco
Eduardo Henrique Accioly Campos

O Núcleo Estadual Libertando Subjetividades, integrado à Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial, vem, mais uma vez, apresentar ao Governo do Estado suas preocupações e proposições no que se refere aos Direitos Humanos, no contexto da Saúde Mental e Reforma Psiquiátrica.

O Movimento Nacional da Luta Antimanicomial nasceu em Bauru/ SP, no ano de 1987, com o lema “Por uma sociedade sem manicômios”, defendendo o direito das pessoas com transtornos psíquicos ao cuidado em liberdade, articulando para isso vários movimentos de Direitos Humanos.

É importante registrar que, em 17 de agosto de 2006, o Brasil foi condenado por abuso de Direitos Humanos na Corte Interamericana de Direitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos(OEA),pela morte de Damião Ximenes,brutalmente assassinado em Hospital Psiquiátrico, conveniado ao SUS, na Cidade de Sobral (CE), em 1999 (JC 19/08/06).

O Núcleo Estadual Libertando Subjetividades, na perspectiva de combater situações de violação de direitos humanos, luta pela efetivação da Reforma Psiquiátrica no Estado de Pernambuco. A partir do contexto de redemocratização do nosso País e da Reforma Sanitária, respaldada pelas leis estadual 11.064/94 e nacional 10.216/01, a Política Ministerial aponta, de forma clara, para a expansão da rede substitutiva, paralelamente, a uma progressiva diminuição da rede hospitalar.

A proposta é criar uma rede de atenção que cuide das pessoas com transtornos psíquicos, envolvendo a família e seu entorno, ajudando a superar os momentos de crise e conviver em sociedade com sua forma de ser e se relacionar e com acesso às ações de saúde. Priorizar uma atenção em serviços territoriais como Centro de Atenção Psicossocial - CAPS (serviços diurnos e noturnos para acolhimento e cuidado à crise, substituto à internação psiquiátrica), residências terapêuticas (moradias na comunidade para aqueles que perderam vínculo familiar), saúde mental na atenção básica (potencializando o Programa Saúde da Família), leitos em hospitais gerais e outros dispositivos assistenciais abertos, como Centros de Convivência e Projetos de Geração de Renda, importantes para o processo de cuidado contínuo e inserção das pessoas com sofrimento psíquico e usuários de álcool e outras drogas na nossa sociedade.

Hoje, Pernambuco, segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde[1], tem 35 CAPS cadastrados, sendo 50% destes localizados no Recife e 16 Residências Terapêuticas concentradas no Recife e em Camaragibe. Entretanto, ainda ocupa nacionalmente o terceiro lugar, no que se refere ao número de leitos psiquiátricos (2.911), distribuídos em 15 hospitais.

Considerando que o Governo do Estado tem o papel de desenvolver uma Política de Saúde Mental, na perspectiva dos princípios do SUS e da Reforma Psiquiátrica, entendemos que deve atuar como indutor/condutor desta Política, nos diferentes municípios da nossa região, estimulando, inclusive, a expansão das ações para o interior.

Neste sentido, dentre as diversas ações a serem desenvolvidas, reivindicamos:
  • Medidas concretas para reverter a situação de barbárie em que ainda se encontram milhares de cidadãos em nosso Estado, os quais estão dentro dos Hospitais Psiquiátricos públicos e privados, sofrendo maus tratos, negligências, preconceitos, chegando inclusive, a óbitos;
  • Diminuição do número de leitos nos hospitais psiquiátricos e paralela a expansão dos serviços substitutivos, considerando que, no nosso Estado, esta proporção não vem ocorrendo de acordo com as recomendações do Ministério da Saúde;
  • Descredenciamento e fechamento das unidades de saúde que não se adequarem à avaliação do PNASH (Programa Nacional de Avaliação do Serviço Hospitalar), que aponta a má qualidade na prestação de serviços na assistência às pessoas com sofrimento psíquico. O que não foi observado em várias instituições que receberam avaliação negativa por anos consecutivos e não houve uma intervenção para mudar esta realidade por parte das autoridades competentes. Como exceção apontamos a ação do Ministério Público do Paulista que provocou junto aos gestores estadual e municipal, a assinatura do Termo de Ajustamento de Conduta, resultando no processo de descredenciamento do Hospital Psiquiátrico do Paulista do SUS, frente à constatação da violação dos direitos humanos dos pacientes lá internados;
  • Apoio técnico e financeiro para ampliação do número dos serviços substitutivos de saúde mental – os CAPS para criança, adolescentes, pessoas adultas com transtornos psíquicos e aquelas que fazem uso de álcool e outras drogas;
  • Incentivo aos municípios com mais de 100.000 hab. para implantação de CAPS III, por ser um serviço com funcionamento 24 horas, para acolhimento noturno de casos graves pois, atualmente, só contamos com um CAPS desse tipo em todo Estado de Pernambuco;
  • Criação de Centros de Convivência na Comunidade e Programas de Geração de Renda, articulados com a Economia Solidária e potencializando a Política de Emprego Protegido;
    Avançar com a interiorização da Reforma Psiquiátrica, inclusive instituir os consórcios entre os municípios;
  • Ampliação da intersetorialidade para as questões do uso de álcool e outras drogas com investimentos para implantação de ações de saúde referentes à população que apresenta demandas nesta área, nos diferentes municípios pernambucanos;
  • Priorizar ações integradas de prevenção e garantir leitos em hospitais gerais para os processos de desintoxicação e ações de redução de danos, independente da decisão do usuário em relação ao uso, primando pela diminuição dos agravos à saúde;
  • Investir e apoiar a Política de Urgência e Emergência de Saúde Mental compatível com o Modelo Psicossocial, junto aos Municípios e incorporando o SAMU nos atendimentos de Saúde Mental de urgência, substituindo, assim, a polícia. Para tal, deve haver de imediato a instituição da Regulação da Assistência em Saúde Mental pelo SAMU, para a reorganização da porta de entrada hospitalar em psiquiatria, hoje concentrada no HGOF (Hospital Geral Otávio de Freitas) e HUP (Hospital Ulisses Pernambucano), cujos serviços mostram-se com problemas graves, inclusive com registros de atendimentos em locais inadequados e mortes de pacientes na própria emergência, constando em documentos oficiais e divulgados recentemente pela imprensa;
  • Conduzir os Municípios,visando a agilizar o posicionamento e providências para a implantação dos NASF's (Núcleo de Apoio ao Saúde da Família), os quais ampliarão a assistência em Saúde Mental na atenção básica, junto ao Programa Saúde da Família, possibilitando uma atenção mais próxima e resolutiva dentro da própria comunidade.
Alertamos, ainda, para o fato de que dos 2.911 leitos psiquiátricos do nosso Estado, estima-se que 40 à 50% são preenchidos por pessoas com internação de longa permanência (com mais de dois anos de internação psiquiátrica, com vínculos familiares e comunitários perdidos), e que, portanto, urge a necessidade de um programa de desinstitucionalização, com expansão dos serviços residenciais terapêuticos (moradias inseridas em diferentes comunidades) mediante articulação intersetorial das Secretarias de Saúde, das Cidades e de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos, de acordo com o compromisso da Presidência da República em 2007.

O Programa de Desinstitucionalização, citado acima, vem beneficiando em todo o país pessoas com longo histórico de internação, através de tecnologias de cuidados comprovadas e viáveis financeiramente com a relocação de recursos de internação de longa permanência, o incentivo financeiro do Ministério da Saúde e Bolsa de Apoio à desospitalização.

Diante do exposto, damos ênfase à necessidade de medidas concretas para reverter a injustificável dívida social do nosso Estado, para com cerca de 600 pessoas com longo período de internação que se encontram no Hospital Alberto Maia, em Camaragibe, um dos maiores do Brasil, com funcionamento bastante precário e com registros, nos anos de 2006 e 2007, de 47 mortes dentro do Hospital[2], além de 39 óbitos por intercorrência clínica após transferência destes pacientes para hospitais gerais.

Certos que encontraremos um Governo sensível às questões da população e aberto ao diálogo com a sociedade, esperamos posicionamento e solicitamos providências imediatas, colocando-nos a disposição para as medidas necessárias em prol de uma sociedade mais solidária, tolerante à diferença e “sem manicômios”.

Atenciosamente,

• Núcleo da Luta Antimanicomial de PE - Libertando Subjetividades;
• Conselho Regional de Psicologia – 2° Região – CRP 02;
• Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional;
• Secretaria Municipal de Saúde da Cidade do Recife;
• Prefeitura de Chã Grande;
• Associação de Usuários de familiares e amigos de Saúde Mental de Chã Grande – AUFA;
• Conselho Regional de Serviço Social;
• CAPS Rasgando a Tristeza-Salgueiro;
• CAPS Solar dos Guararapes – Jaboatão;
• Conselho Estadual De Saúde - CES;
• Comissão Estadual de Reforma das Políticas de Saúde Mental do CES;
• Secretaria Municipal de Saúde de Camaragibe;
• Sindicato dos Psicólogos de Pernambuco- PSICOSIND;
• Prefeitura do Paulista;
• Secretaria Municipal de Saúde do Cabo de Santo Agostinho;
• Comissão Pastoral da Terra- CPT;
• Centro Josué de Castro

[1] Dados fornecidos pela Coordenação Estadual de Saúde Mental de Pernambuco
[2] Dados fornecidos pela Secretaria de Saúde de Camaragibe
Nota: Até a presente data não houve resposta do governo do Estado de Pernambuco.

domingo, 17 de agosto de 2008

Pernambuco comemora retirada dos internos do Hospital Psiquiátrico de Paulista

Foto: Rogelio Casado - RENILA no Recife-PE - Julho/2008

PERNAMBUCO NA LUTA ATIVA, PROPOSITIVA E POSSÍVEL

VENCEMOS UMA BATALHA MUITO IMPORTANTE NA LUTA POR UMA SOCIEDADE SEM MANICÔMIOS, AO FECHARMOS O HOSPITAL PSIQUIÁTRICO DE PAULISTA (HPP).

A COMEMORAÇÃO DESSA VITÓRIA É DE TODOS NÓS MILITANTES, MAS É, EM ESPECIAL, PARA CADA UMA DAS PESSOAS QUE CONHECEREAM O INFERNO EM VIDA.

PARABÉNS PARA TODA A EQUIPE QUE TRABALHOU NO PROCESSE DE DESINSTITUCIONALIZAÇÃO DOS INTERNOS DO HPP.

COMO DIZIA A DRA. RITINHA, SE TODOS OS PROFISSIONAIS DA SAÚDE (SUS) TRABALHASSEM COMO VOCES, CERTAMENTE TERÍAMOS UM MUNDO MELHOR!

PARA CELEBRAR, LEIAM A POESIA DE MOACY FÉLIX, PUBLICADA EM SEU LIVRO DE POEMAS "EM NOME DA VIDA":

"EU QUERO NOVAS BANDEIRAS
QUERO A CORAGEM DE DIZER QUE AS QUERO
QUERO, SOBRETUDO, NÃO TER MEDO DE QUEIMAR AS QUE APODRECERAM
NA ESCURIDÃO DOS PODERES QUE ORA COMANDAM A CONSUMAÇÃO DAS IDÉIAS E DOS FATOS.

NOVAS BANDEIRAS E A CONTINUIDADE
DAS BELEZAS ANTIGAS QUE FICARAM BOIANDO, ECOS DE ESTÓRIAS E LENDAS DAS BANDEIRAS QUE DESAPARECERAM
NÃO POR PODRES, MAS POR DESGASTADAS
NAS MÃOS QUE AS SOUBERAM ERGUER
COMO ARMA, LEITO DE AMOR E TENDA
PARA IMENSIDÃO INDA SEM TETO.

QUERO-ME NOVO NOS MODOS DO MEU NETO
ABRINDO PORTAS QUE NÃO ESTAS.
QUERO-ME NOVO COMO O TEMPO QUE NÃO TEME
O ESPAÇO EM BRANCO E PEDIR UMA POESIA
PESCADA ATRÁS DO ESPELHO QUE SE MIRA

O HOMEM DE AGORA NOS POSSÍVEIS DO AMANHÃ.
QUERO-ME NOVO, PORÉM TÃO NOVO COMO
ESTA SAUDADE INCRÍVEL DE PISAR DESCALÇO
NO TURBILHÃO ABANDONADO PELO HOMEM
NAS SOMBRAS DOS DEUSES QUE INVENTOU
AO ACHAR-SE DESNUDO EM FRENTE AO TROVÃO
OU DO QUE A MORTE NÃO LHE DIZIA
COMO RAZÃO FINAL DE MORRER. OU DE VIVER.

"Núcleo da Luta Antimanicomial "Libertando Subjetividades"
Filiada à Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial

Núcleo da Luta Antimanicomial Libertando Subjetividades – PE comemora o fechamento do Hospital Psiquiátrico de Paulista-PE

O Núcleo da Luta Antimanicomial Libertando Subjetividades – PE (filiada à Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial), que tem como Coordenadora a psicóloga Nelma Melo, tinha motivos de sobra para comemorar o fechamento do Hospital Psiquiátrico de Paulista – HPP, no dia 20/06/2008. A história desse evento (enquanto conceito estabelecido pelo geógrafo Milton Santos) está por ser contada. De parabéns os militantes do Núcleo e todos os atores sociais comprometidos com a luta por uma sociedade sem manicômios em Pernambuco.

O Ministério Público Estadual - 3ª Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania do Paulista - exigiu no dia 10/01/08 o fechamento do Hospital Psiquiátrico de Paulista (HPP). Alvo, nos últimos anos, de várias avaliações que indicavam a necessidade de seu fechamento, nenhuma ação concreta havia sido tomada pelos gestores até então.

Decisiva foi a atuação firme, na defesa dos direitos humanos e da cidadania, da promotora Selma Carneiro Barreto da Silva. Além de atuar no processo de fechamento do Hospital, ela vem exigindo a ampliação e o fortalecimento da Rede Substitutiva ao Manicômio no Município do Paulista.

sábado, 9 de agosto de 2008

Leitos psiquiátricos continuam na pauta do debate público

Instrumento de trabalho da psiquiatria conservadora

Nota: Em setembro de 2006, Marcus Vinicius de Oliveira, militante da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial - RENILA pautou uma proposta de discussão sobre leitos psiquiátricos, após um ruído de comunicação provocado por uma entrevista concedida em Manaus pelo Coordenador Nacional de Saúde Mental, dois meses depois da Associação Brasileira de Psiquiatria - ABP sair do barco da luta por uma sociedade sem manicômios. O tema continua na ordem do dia.

Companheiros,

Gostaria de aproveitar a oportunidade da matéria abaixo, para propor nessa lista, uma discussão sobre o tema dos leitos. O tema dos “leitos” parece que nos persegue e é a nossa pedra do tropeço na Reforma Psiquiátrica. Ele nos remete ao paradigma da clinica, como uma clinica de “ enfermos deitados” e encontra eco num imaginário que afirma um ideal de “cuidados” aos portadores de transtorno mental como atenção médico hospitalar. Na entrevista abaixo, certamente não era a intenção do Coordenador Nacional de Saúde Mental enfocar que estão “faltando” leitos – sabemos que ele não pensa assim -, entretanto foi essa a manchete na interpretação do jornalista. A idéia de que a “boa atenção” se faz com hospitais, está muito arraigada e tem muitos defensores. A questão da inevitável “necessidade da internação” de alguns pacientes “mais difíceis” apoquenta a vida dos nossos Caps e outros serviços - em alguns casos com auto-critica dos limites do serviço e da equipe para produzir a continência das crises e enfrentar as complexas tramas sociais que elas envolvem - mas em grande parte das situações aparece como a naturalização de um recurso complementar “inevitável”.

Tenho em várias oportunidades apontado para a existência de diferentes projetos políticos de reforma psiquiátrica dentro da Reforma Psiquiátrica, no que diz respeito a radicalidade da clinica em relação ao tema da internação e/ou da continuidade da existência de alguns “hospitais psiquiátricos do bem”, ou do caráter fundamental, estratégico e imprescindível da existência de leitos em hospitais gerais para o sucesso da reforma. (lembro-me de que nas origens do debate esse ultimo argumento era utilizado como um recurso tático).

Penso mesmo que o contra ataque da ABP veio explicitar a presença de um polo radical deste pensamento, que pretende salvaguardar a co-existência do espaço hospitalar com a presença de serviços “substitutivos”, agora colocados como serviços “alternativos”: o paciente alterna do CAPS para a internação e vice versa. Na relação dos núcleos do movimento social com algumas coordenações estaduais e municipais de saúde mental, temos várias vezes nos deparados com defensores de posições muito semelhantes: querem uma reforma psiquiátrica que signifique expansão e modernização de serviços sem que isso signifique necessariamente a substituição integral dos leitos psiquiátricos ou uma ruptura com o paradigma de que a internação é apenas mais um recurso técnico. (E atenção que não estamos propondo qualquer desospitalização “irresponsável” ou ignorando as dificuldades políticas de se fazê-lo).

Creio que já produzimos na caminhada desde o congresso de Bauru, os elementos teóricos e técnicos para o enfrentamento deste debate, que prescinde da alusão aos “leitos” e da idéia central da internação psiquiátrica, com resposta às crises. As idéias da hospitalidade noturna, internação-dia, pensão protegida, direito de asilo, o conceito do CAPS III, emergência integrada – particularmente tenho investido no conceito de “intensificação de cuidados” - dentre tantas outras, já nos permite parar de ficar repetindo o receituário da OMS e seus parâmetros sobre “necessidades” de leitos psiquiátricos, para uma dada população. Aliás, acho que já é hora de pararmos de usar a OMS como referencia para o projeto de reforma brasileiro pois se a OMS não é hospitalocêntrica, ela mantém o paradigma “manicomial” da necessidade de um nível terciário para a garantia de uma “boa” assistência em saúde mental. E vários coordenadores recorrem aos seus índices para dizer que a Reforma Psiquiátrica vai bem em seus estados e municípios pois tem índices de leitos psiquiátricos abaixo do “preconizado” pela OMS.

Pensamos que a radicalidade da tensão antimanicomial é o sal da terra da Reforma Psiquiátrica Brasileira - e não uma doença infantil, da qual deveríamos nos livrar em nome das maturidades técno-administrativas - que fez toda a diferença ao longo da história e tem dado o tom do seu desenvolvimento e da sua competência como projeto político. Pensamos que o enfrentamento do contra ataque covarde da ABP tem que, necessariamente, recuperar a ofensiva ideológica antimanicomial em todos os espaços – de gestão, do fazer técnico da clinica, da formação dos profissionais – e que um dos elementos centrais do debate ideológico antimanicomial, esta centrado exatamente nessa figura da “existência dos leitos psiquiátricos” como recurso da Reforma. Gostaria muito de conhecer as opiniões dos colegas acerca desse tema. Ao trazê-lo a lista, mais do que afirmar as idéias expostas, me move o desejo de compartilhá-las e conhecer os seus eventuais contapontos.

Grato pela atenção,

Marcus Vinicius de Oliveira

***

“Quantidade de leitos é insuficiente para atender portadores de doença mental, diz coordenador”

Panorama Brasil (SP)

18 de setembro de 2006

Agência Brasil

MANAUS - Cerca de 3% da população brasileira é portadora de doença mental grave. Isso significa que aproximadamente 5,4 milhões de pessoas precisam de cuidados médicos constantes. Para atendê-las, no entanto, existem 41 mil leitos nos hospitais psiquiátricos do país.

“A quantidade é insuficiente para a demanda”, diz o coordenador nacional de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Pedro Delgado.

Segundo ele, em 1996, eram 72,5 mil leitos, e a diminuição da quantidade foi algo proposital. “Muitos hospitais psiquiátricos foram fechados nos últimos 10 anos graças a denúncias de maus tratos e à reorientação no tratamento dos doentes mentais, que passou a privilegiar a terapia não-hospitalar e a convivência comunitária”, explicou, em entrevista hoje (18) à Radiobrás.

Ele informou que, entre 1998 e 2005, o orçamento do governo federal para a área de saúde mental quase dobrou, passando de R$ 442 milhões para R$ 814 milhões.

“Ele representa somente cerca de 2,4% dos recursos totais do SUS [Sistema Único de Saúde], mas vem crescendo”, argumentou. “Antes, a maior parte dessa verba, 92%, ia para internações. Agora, os gastos hospitalares representam 55% dos gastos”.

Delgado disse, ainda, que aproximadamente 21 milhões de pessoas sofrem de transtornos mentais como depressão e ansiedade. “São problemas que podem causar grande sofrimento à pessoa se não forem bem cuidados”.

Em defesa da Reforma Psiquiátrica brasileira: contra os elitismos corporativistas e contra a covardia !

Foto: Rogelio Casado - Abraço simbólico pelo fim do hospital psiquiátrico - Manaus-AM, 2007

Nota: No encontro presencial do Recife, o Conselho Federal de Psicologia foi reafirmado como uma das principais entidades parceiras da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial - RENILA na luta por uma sociedade sem manicômios. Prova desse compromisso foi a carta divulgada pelo CFP quando o presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria saiu do barco atirando para todos os lados. Em causa, uma Reforma que não abre mão do "bom" hospital psiquiátrico, como defende a ABP, e um movimento social que luta pelo fim dos hospícios, como o CFP - bandeira divida com a RENILA, de modo claro e insofismável.

Em defesa da Reforma Psiquiátrica brasileira: contra os elitismos corporativistas e contra a covardia !

Num país marcado pela existência de graves injustiças sociais que a condução política jamais ousa enfrentar radicalmente, chama a atenção o singular processo representado pela Reforma Psiquiátrica Brasileira.

Nela, a situação injusta e desumana de milhares de portadores de sofrimento mental, reclusos em hospitais psiquiátricos, vem sendo objeto de um incisivo enfrentamento. Ao longo dos últimos 20 anos, num movimento que já possui lugar na história e firme presença no cenário nacional, conquistas importantes vêm sendo obtidas, no que diz respeito à garantia dos direitos e à oferta de cuidados aos portadores de sofrimento mental.

Denúncias sistemáticas e bem documentadas de violações aos Direitos Humanos nas instituições psiquiátricas chegam ao conhecimento público desde a terrível situação de Barbacena, em 1979, até a divulgação recente de mortes ocorridas em sinistros hospitais psiquiátricos brasileiros. Desde 1992, no Rio Grande do Sul, surgem novas legislações estaduais e municipais que afirmam os inalienáveis direitos de cidadania dos portadores de sofrimento mental, culminando, em 2001, na aprovação da Lei Federal 10.216.

Modelos assistenciais substitutivos aos hospitais psiquiátricos, guiados pela lógica do cuidado, da inclusão e da reinserção social, demonstram concretamente sua viabilidade e eficácia, a começar pelo exemplo de Santos, em 1989, até experiências atuais e atuantes, nos mais diversos locais do país. Em inúmeros espaços públicos de debates e deliberações, vai se delineando, com clareza crescente, uma política voltada para a conquista da cidadania, sempre negada aos chamados doentes mentais, desde o I Encontro Nacional de Trabalhadores de Saúde Mental, em Florianópolis, 1978, até a importante III Conferência Nacional de Saúde Mental, no final de 2001.

Nestas diversas frentes, cabe ressaltar a atuação firme e constante dos movimentos sociais e das entidades profissionais, cobrando do poder público seu compromisso com a efetivação de uma Reforma Psiquiátrica verdadeira. E todo este processo vai se constituindo num verdadeiro patrimônio de toda a sociedade brasileira, no qual a vida de dezenas de milhares de brasileiros é fortemente impactada no seu cotidiano, ampliando-se a sua qualidade, proporcionada por uma atenção efetiva, realizada eticamente, em regime de liberdade e convivência social através dos CAPs, hospitais-dia, moradias protegidas, centros de convivência.

Destacamos o cenário adverso em que se dão estas importantes conquistas: num contexto nacional onde as políticas sociais são escassas e pobres, enfrentamos ainda a existência de um parque manicomial de cerca de 40 mil leitos, consumindo ainda quase meio bilhão de reais por ano dos recursos do SUS. É a chamada indústria da loucura, embora não tão rentável como já foi, que ainda exerce inescrupulosamente, em todo o país, o destrato, o descuido, o abandono, atingindo pesadamente um grande contingente dos portadores de sofrimento mental brasileiros.

Neste cenário surpreende, causa repúdio as declarações “de encomenda” da Associação Brasileira de Psiquiatria, representada pelo seu presidente Dr. Josimar França, (veiculado no Jornal O Globo, de 20/07/2006) que, se pretextando “ofendido” com a associação entre certas condições assistenciais, ainda persistentes, e a existência de violação de Direitos Humanos na área da Saude Mental, aproveita para desembarcar de vez, com todas as suas malas, do bonde democrático do processo da Reforma Psiquiátrica e atacar as suas conquistas.

Usando e abusando de falácias, o seu artigo na verdade tem como finalidade advogar, na contra mão das tendências mundiais, a favor da manutenção dos hospitais psiquiátricos como feudos corporativos e contra o incômodo fim dos privilégios dos empresários da Psiquiatria e de uma certa elite acadêmica. A Psiquiatria de gravata utiliza destes estabelecimentos como campo privilegiado para experimentos locais, teleguiados pela indústria farmacêutica mundial.

Na verdade, desde o início da Reforma Psiquiátrica no país, diferentemente, a maioria dos milhares de psiquiatras brasileiros, parceiramente, sustentam o processo no cotidiano dos Serviços Substitutivos e nunca deixaram de combater e colocar obstáculos para que se pudesse fazer avançar a democratização da assistência à Saúde Mental. Mas não é nova essa posição que sempre apostou no insucesso da Reforma, que a difamou, que mentiu, que buscou manipular familiares e a opinião pública, impedindo de todas as formas o acesso da sociedade brasileira à terrível realidade dos hospitais psiquiátricos. O que é novo é a sua exposição desesperada diante do êxito e da expansão dessa política pública, nesse último governo. É o uso da autoridade da entidade nacional dos psiquiatras, que, desde 1990, vinha apoiando a Reforma Psiquiátrica Brasileira, através de vários manifestos e posicionamentos oficiais, para a veiculação das atuais teses corporativistas das entidades médicas, lamentavelmente associadas à inconformidade com as exigências de um relacionamento mais democrático dos médicos no interior das equipes multiprofissionais de saúde, de um relacionamento mais democrático dos profissionais de saúde para com os usuários dos serviços substitutivos, de um relacionamento mais horizontal entre os vários saberes e profissões que hoje constroem o Sistema Único de Saúde.

O que fica evidente, na extemporânea linha de argumentação do dirigente, é o seu alinhamento com a política corporativista do ATO MÉDICO, é a defesa da manutenção do hospital como a garantia da existência de um feudo, onde o poder médico ainda possa ser exercido e defendido, a despeito do custo negativo que isso possa ter para a vida e para o tratamento dos portadores de transtorno mental. E a defesa de uma pratica médica onde seja possível ao profissional se desresponsabilizar diretamente pelo cuidado dos pacientes de quem ele trata, reduzindo a sua atuação a uma mera prescrição farmacológica.

É a tentativa de não participação do médico no cotidiano dos cuidados hoje desenvolvidos nos serviços substitutivos de forma integrada por todos os integrantes da equipe multiprofissional. Como sabem aqueles que realmente trabalham em serviços territoriais: paciente preso (internado) no hospício, médico solto; paciente solto no território, médico preso no serviço! Tentativa deplorável pela posição que representa: inteiramente descomprometida com a dimensão pública, estritamente voltada para interesses coorporativos e privados. Deplorável pelo seu alinhamento tão estreito, com os interesses mesquinhos da “indústria da loucura”, representada pela FBH, que sempre reuniu a fauna faminta dos detratores da Reforma Psiquiátrica.

Contrapondo-se ao covarde ataque corporativista, este manifesto vem reafirmar a beleza e o vigor da Reforma Psiquiátrica em andamento. Sustentamos a defesa deste alicerce de um modelo de assistência para o sofrimento mental, e de uma presença na cultura para a diferença, que são motivos do mais justo orgulho para a sociedade brasileira.

Na III Conferência Nacional de Saúde Mental, órgão máximo do controle social do SUS - em dezembro de 2001, reuniram-se cerca de 1.250 participantes dentre os quais mais da metade eram usuários, familiares, representantes de movimentos sociais e membros usuários de Conselhos de Saúde. Neste fórum expressivo e amplo, manifestou-se de forma inequívoca a deliberação pela extinção progressiva dos hospitais psiquiátricos e da implantação de um modelo substitutivo de assistência ao sofrimento mental. Reiterando nosso apoio a esta corajosa decisão, as entidades e instituições abaixo-assinadas convocam os numerosos atores, defensores e participantes da construção da Reforma Psiquiátrica a defendê-la conosco, mais uma vez, contra a ação covarde de todos os manicômios e dos seus patrocinadores.

Conselho Federal de Psicologia

domingo, 3 de agosto de 2008

Associação Chico Inácio pede passagem e saúda a RENILA

Foto: Rogelio Casado - Associação Chico Inácio - Manaus-AM, 2003

Do Amazonas, a Associação Chico Inácio saúda @s companheir@s da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (usuários, familiares e técnicos) e convoca a tod@s a por em prática a decisão do último encontro no Recife: registrar eventos, dar notícias, fazer circular a informação, denunciar a falta de respeito aos direitos humanos dos sujeitos marcados pela diferença e pela alteridade radical da loucura, analisar criticamente as políticas municipais, estaduais e federal de saúde mental na perspectiva da desinstitucionalização da loucura em todas as suas conseqüências críticas e identificar os dispositivos que sustentam projetos de pouca ressonância coletiva. Como nos lembra Marcus Vinicius, se a RENILA, enquanto movimento social, não responde pelas reivindicações de direitos dos usuários dos serviços de saúde mental, a cada dia ela é mais solidária na mobilização e no encaminhamento das mesmas. Este blog pretende ser um instrumento de solidariedade na luta pela emancipação dos usuários e pela construção de uma sociedade sem manicômios.
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Encontro da RENILA no Recife

Foto: Anita, irmã de Jacaré - RENILA - Recife-PE, 17.07.2008
Alô companheir@s,

Às margens do Capibaribe, na bela cidade do Recife, a Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial - RENILA, entre os dias 26 e 27 de julho de 2008, reafirmou dois compromissos éticos indissociáveis: lutar por uma sociedade sem manicômios e andar em boa companhia.

Paulinho, o Cara - representante das Minas Gerais, do Fórum Mineiro de Saúde Mental - fez uma pequena correção na proposta aprovada durante o encontro no quesito comunicação que me levou a fazer um blog único para todos os núcleos filiados à RENILA. Usem e abusem. Estarei passando a senha para que cada núcleo possa registrar eventos, notícias, informações y otras cositas más.

Ainda sob os eflúvios desse encontro tão bem organizado pel@s companheir@s do Núcleo Libertando Subjetividades, do Recife, saúdo os militantes da RENILA de todas as latitudes brasileiras.

Rogelio Casado, da Associação Chico Inácio, de Manaus-Amazonas.