O ex-conselheiro e presidente do Conselho Federal de Psicologia, Marcus Vinícius de Oliveira obteve ganho de causa, em primeira instância, no processo movido pela Federação Brasileira de Hospitais (FBH) no qual era acusado de estar “sistematicamente difamando e caluniando os hospitais psiquiátricos brasileiros, seus dirigentes e demais profissionais, através de publicações oficiais do Conselho Federal de Psicologia, artigos publicados em revistas e em entrevistas atribuindo a todos, entre outras mazelas que o hospital psiquiátrico é uma instituição sinistra onde ocorreriam torturas e assassinatos”.
O processo, que tramita desde 2002, foi iniciado pouco após a publicação do livro “A Instituição Sinistra”. organizado por Oliveira que, à época, era vice-presidente do CFP.
Na sentença, o juiz Egas Moniz Barreto de Aragão Dáquer avalia improcedente o pedido da Federação Brasileira de Hospitais. Afirma que “não há na conduta do réu ilicitude que justifique uma reparação de caráter punitivo e pedagógico em favor da autora, a título de dano moral ser obtida através do judiciário” e condena a autora ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado.
O juiz postula também que “o que não deve - e não pode - é que esta censura à posição defendida pelo réu seja chancelada pelo Poder Judiciário como ofensiva à autora e a seus associados, para daí tirarem vantagem financeira. Como pode ser visto dos autos, através das peças trazidas pelas partes, a posição adotada pelo réu é também adotada por outros profissionais - médicos psiquiatras ou psicólogos. O réu apenas fez diversas denúncias, reportando-se a diversos pesquisadores, na tentativa de ser prestigiado seu ponto de vista”.
“Ganham na primeira instância a liberdade de expressão, a luta antimanicomial, todos os nossos parceiros de luta e os maiores interessados que são os usuários”, disse Oliveira.
A Federação Brasileira de Hospitais pode recorrer da decisão.
FONTE: POL
sexta-feira, 30 de outubro de 2009
quarta-feira, 21 de outubro de 2009
Marcha conquista IV Conferência de Saúde Mental e retoma a urgência do fim das torturas
Tendo reunido 2300 pessoas na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, com música, dança, bonecos, cartazes e faixas defendendo as formas de tratamento que substituem o velho manicômio e permitem o convívio social aos portadores de transtorno mental, a Marcha dos Usuários pela Reforma Psiquiátrica Antimanicomial fez acontecer o que parecia improvável: pessoas chamadas loucas, inválidas, com histórias de internações, vieram a Brasília e foram recebidas pelo Planalto, em dez audiências em ministérios, na Câmara e no Senado.
De invisíveis, como bem apontou Gilberto Carvalho, chefe do gabinete pessoal do presidente da República que recebeu 35 manifestantes, os usuários da saúde mental conquistaram lugar de cidadãos. Foram ouvidos, o governo deliberou com eles. Marcharam organizadamente, apresentaram pautas precisas, conhecedores que são da situação real das políticas públicas a eles destinadas – ou das que precisam ser criadas, como é o caso das relacionadas à subsistência, renda e economia solidária.
A vitória imediata da Marcha foi o compromisso com a realização da IV Conferência Nacional de Saúde Mental ainda nesse governo, assumido por Gilberto Carvalho com anuência do presidente Lula. Carvalho mostrou-se sensível às denúncias de mortes e torturas em hospitais psiquiátricos. Eles ainda recebem metade da verba da saúde mental, proveniente do Sistema Único de Saúde, sem que recuperem os pacientes internados, como de fato fazem os serviços abertos como os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), quando estão estruturados e em funcionamento.
Sobre a persistência de tortura e maus tratos, Carvalho se disse “assustado” com o que ouviu e assumiu a tarefa de colocar o tema para o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, responsável pela implementação da Reforma Antimanicomial. Paulo Vannuchi, secretário especial de Direitos Humanos, ressaltou que a tortura se alimenta da impunidade e se comprometeu a estruturar o tratamento do tema na secretaria, em diálogo, sobretudo, com o Ministério da Saúde.
Com relatos vivos, a marcha conseguiu colocar na pauta do governo federal a necessidade da Reforma Psiquiátrica, instituída por lei em 2001 pela Lei 10.126. Dossiê apresentado pelo Instituto Damião Ximenes, do Ceará, sobre o município de Ipueiras, trouxe imagens de pacientes encarcerados em celas, sem acompanhamento médico, psicológico ou condições de higiene. A cidade tem um Caps que recebe visita de psiquiatra três vezes ao mês, sem, portanto, ter estrutura profissional para atender nem mesmo os pacientes em tratamento.
Na audiência com a ministra interina da Saúde, Márcia Bassit, os manifestantes argumentaram que, ao pedirem celeridade para a Reforma, não tratam do tempo que querem, mas do tempo necessário par evitar mortes nos hospitais psiquiátricos. A implementação da reforma seria acelerada com o pleno funcionamento dos Caps; com a solução da constante falta de verbas para as atividades na ponta; qualificação dos profissionais; e abertura de Caps III, que realizam atendimento 24 horas.
Os usuários, cujas organizações são agregadas pela Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial, não têm dúvidas da importância dos diálogos sobre a defesa da Lei 10.216/91, sobre a necessidade do fim das interdições judiciais ou do desenvolvimento das políticas de assistência, como o Programa de Volta para Casa, que tem por objetivo reintegrar socialmente usuários que passaram por longas internações.
A estes temas somam-se o fim dos manicômios judiciários e o acesso ao tratamento de saúde mental, nos moldes da Lei 10.216, para portadores de sofrimento que estejam respondendo a processos ou cumpram penas. Todos os pontos foram pautas das audiências com os ministérios da Justiça, do Trabalho, Cultura, Desenvolvimento Social, INSS, Conselhos Nacionais de Secretarias Municipais de Saúde e de Secretários de Saúde, que também receberam a marcha e se propuseram a caminhar no esforço de incorporar a realidade da saúde mental em suas atividades.
Terminadas as audiências, os usuários, agora marcados pela experiência da possibilidade de ação coletiva, seguem presentes, atentos, sobretudo visíveis. Neste 10 de outubro, quando os países celebram o Dia Mundial da Saúde Mental, esperamos que o momento marcante de tomada de voz pelos usuários, no Brasil, marque a retomada do andamento da Reforma Psiquiátrica Antimanicomial.
Humberto Verona – Presidente do Conselho Federal de Psicologia
Nelma Melo – Coordenação da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (Renila)
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